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Descentralizar… o quê?

Decidiu o Governo que temos, iniciar a tão desejada e discutida descentralização, espalhando pelo país três Secretarias de Estado (curiosamente fazendo coincidir as novas sedes com a zona de residência dos respectivos titulares).

A ideia não é nova. Já o breve Governo de Santana Lopes a ensaiara, embora de forma mais generosa no que toca ao número de Secretarias a espalhar. O que é novo é a «conversão» do Partido Socialista a este modelo de descentralização, com cujo ridículo tanto gozou e cuja vacuidade tanto zurziu no consulado santanista.

Ora, com tão bizarras medidas pretende-se (e pretendia-se) descentralizar… o quê? Descentralizar geograficamente os centros de decisão do Poder central que, assim, centralizado continua a estar? Porque, nesse caso, o Poder continua central, só que sediado em Bragança, Castelo Branco ou Guarda e não em Lisboa. Não é a localização da sede do Poder que determina, ou não, a sua descentralização, mas sim a sua repartição por outros órgãos estatais.

Por isso, a solução santanista agora socialistamente recuperada, não só não descentraliza, como tem efeitos perversos se não mesmo contrários. Todo o quadro de funcionários, todo o aparelho administrativo permanece em Lisboa – nem é legalmente possível (nem justo) forçar a sua deslocação para outras paragens. O que se desloca é apenas o gabinete do Secretário de Estado – com todas as vantagens que isso possa ter para o titular e todos os custos resultantes para o erário público. Ou seja: as Secretarias de Estado da Acção Social; da Conservação da Natureza, das Florestas e do Ordenamento do Território; e a da Valorização do Interior – passam a ser teledirigidas a partir, respectivamente, da Guarda, de Castelo Branco e de Bragança. O que, fatalmente, tornará a burocracia mais complexa e a máquina administrativa mais pesada, mais cara e… ainda mais lenta.

Descentralizar, descentralizar a sério e com recta intenção, significa repartir o poder do Poder Central. Significa abdicar de poderes para os atribuir ao Poder Local. Significa entregar às Autarquias capacidades, competências e VERBAS durante séculos centralizadas pelo Governo, esteja este onde estiver – em Lisboa ou noutro sítio qualquer. Não é a localização que descentraliza o Poder mas, apenas e só, a sua repartição.

Dar o poder de decisão a quem está perto dos problemas, a quem os conhece e vive e, ao mesmo tempo, dando-lhe a consequente capacidade financeira – isso sim, é descentralizar. É honrar as nossas tradições municipalistas (há tanto tempo perdidas) dando às Câmaras Municipais (e às Juntas de Freguesia) o lugar que já tiveram e, de justiça, lhes compete na organização do Estado.

Com mais ou menos cambiantes, «descentralizar» é isto. O que fique além ou aquém são fogos fátuos para inglês ver. Ou, mais rasteiramente: para enganar papalvos.

Nota: por decisão do autor, este texto não obedece ao impropriamente chamado acordo ortográfico.


Autor: M. Moura Pacheco
DM

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3 dezembro 2019