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A Caridade do Arcebispo 3

Concluo a publicação de apontamentos que recolhi sobre a caridade de S. Bartolomeu dos Mártires:
8. A Frei Luís de Granada, seu antigo provincial, que estranhou a pobreza com que vivia e não condizia com a grandeza de Primaz das Espanhas, respondeu o Arcebispo com um conjunto de perguntas:
«Que me faça respeitar dos pobres, gastando com a minha pessoa e tirando aos mesmos pobres aquilo com que os posso remediar e manter? Que me meta em atavios, criados e dourar baixelas e ornar paredes mortas, o cabedal com que posso amparar a órfã, socorrer a viúva e vestir paredes vivas? Que empregue tempo e cuidado em aparato de mesa e mestre de cozinha, para que sobejem potagens que desbaratam a saúde, levam a fazenda e aos pobres não matam a fome?»
«Desenganem-se que nunca me verão tão desatinado com despender, com ociosos, aquilo com que posso dar vida a muitos pobres».
9. Em carta escrita de S. Martim de Pedrosos, a caminho de Trento, recomendava a Frei João de Leiria:
«Entre os pobres, sobre todos, tenha cuidado dos doentes, que não podem andar pedindo.
A minha vontade é que nada se entesoure, mas que tudo se gaste em obras pias, em casamentos de órfãos, assim na cidade como nas câmaras, e nos vestidos dos pobres, e nos estudantes e doentes, e outras minhas esmolas».
10. Tendo conhecimento de que em fevereiro de 1570 a peste iniciada em Portugal dois anos antes tinha invadido a Cidade, o Arcebispo, que andava em visita pastoral, regressou imediatamente a Braga, a fim de prestar assistência aos doentes, não obstante o risco do contágio.
Mandou levantar na Devesa, além da ponte de Guimarães, um hospital para recolher e curar os doentes com o pessoal médico e de enfermagem necessário. Ele mesmo visitava todos os enfermos. Fez guardar com rigorosa vigilância as portas da Cidade. Ordenou fossem feitas fogueiras em todas as praças e ruas e mandou que se limpasse a Cidade de todas as imundícies.
Memórias desta epidemia são, ainda hoje, uma inscrição no cruzeiro de S. João da Ponte, e o «caixão do rolo», existente na capela de S. Sebastião das Carvalheiras.
Adoecendo qualquer capelão ou outro criado seu, o Arcebispo não só fazia diligência que fosse bem curado e provido de todo o necessário, mas ele em pessoa o visitava em cada dia.
11. Foi voto seu, conta Frei Luís de Sousa, quando se achou no Concílio de Trento e nele com veemência instou, que se decretasse que todo o Prelado, depois de tomar de suas rendas o necessário para uma côngrua e decente sustentação de sua pessoa e casa e oficiais, tudo o mais depositasse no tesouro de sua Sé, aplicado logo como património que era de Cristo, para sustentação de pobres e daí se repartisse por eles.
12. «Obrigava a estudar, diz também aquele Biógrafo, os filhos dos homens pobres e honrados da cidade de Braga para depois lhes sustentar a casa com mais abundância, porque enquanto eram moços assinalava-lhes ração de comida e vestido e quando maiores, se continuavam o estudo e davam boa conta de si em vida e costumes, provia-os nos benefícios de sua apresentação, com que ficavam ricos e remediados pais e filhos e toda a família».
13. Já em Viana do Castelo, não tendo mais que dar, deu a própria cama a uma pobre viúva para casar a filha, passando a dormir numa tábua.
Certificado da necessidade, combinou com a senhora que, ao toque das Ave-marias, fosse para debaixo da janela. À hora marcada ele próprio lhe deitou o leito e um lençol.

Autor: Silva Araújo
DM

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28 novembro 2019