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Sinto-me insultado

A Comissão Nacional de Eleições há tempos pronunciou-se a respeito das eleições que se avizinham. Segundo alguns são orientações abusivas e despropositadas. Não nos metemos onde não sabemos e não é sobre essas orientações que nos vamos pronunciar. Verifico com tristeza que, depois de mais de quarenta anos de democracia, ainda há quem se deixe enganar por cartazes, frases abonatórias ou depreciativas, conforme os casos, por inaugurações de obras propositadamente deixadas para o vivório e festório da inauguração que, “por coincidência”, calham sempre em épocas eleitorais.

Fico triste porque isso determina ainda uma menoridade de critério de escolha de voto. Quanto aos cartazes não sei que valor tem aquele rosto mais que o outro e, se repararmos bem, todos eles nos seguem com os olhos. Se são rostos conhecidos ou desconhecidos, ignorados continuarão a ser, por falta de interesse em conhecê-los. As frases em slogan começam a enfastiar como coisa recessa que se tornou bolorenta. Mas quando chegaremos ao ponto de abrir a estrada quando ela estiver pronta sem pompa e circunstância? Seremos assim tão tapados dos elos que não saibamos dar o valor ao seu dono?

Quando uma piscina estiver pronta, ponham-na a funcionar sem esperar pela fanfarra da terra tocar o hino nacional seguida de desfile de bombeiros. Nós sabemos dar o seu a seu dono, não façam de nós ingratos. Quando houver obra feita não guardem a inauguração para encher o olho dos votantes, ponham-na a funcionar que nós saberemos acreditá-la no livro do reconhecimento. Sinto-me insultado com a estratégia das inaugurações, de cartazes, de fotografias artísticas, de slogans balofos e despidos de sentido de verdade; sinto-me insultado só por pensar que eles pensam que eu acredito nessas coisas; sinto-me insultado por pensar que eles pensam que me levam o voto através desta publicidade eleitoral.

Mudem de processos porque estes estão tão insultuosos que me dá vontade de ir votar em branco e, se vou votar, é por respeito à democracia e não por consideração de muitos que arriscaram a vida e bens para podermos ter a democracia. A CNE, por sua vez, deveria levar as populações a serem mais cognitivas que emotivas.

Foi quase sempre assim: os grandes comícios, as bolas, as lapiseiras, os aventais, as tarjas, as arruadas tanto do agrado de todos, é uma herança que apelava às emoções A emoção é uma paixão e sabemos bem quanto estes sentimentos escurecem a razão. Eles abusam da nossa emotividade até ela virar clubite; chegados aqui estamos apanhadinhos de todo e tudo o que disserem do meu clube é mentira e tudo é verdade se for contra os outros.

Este insulto é tão forte que não podermos tolerá-lo, se ainda temos consciência de quem somos. Sinto-me igualmente insultado pelos programas dos partidos. Normalmente são feitos a pensar no aliciamento dos crédulos. Se os cartazes, os comícios, os slogans de campanha e os programas não passam de “publicidade enganosa”, em que vamos votar? Em primeiro lugar, voto, como já disse, por respeito à democracia e depois voto contra aqueles que não quero ver governar-me.

Voto numa destas conceções: “eles comem tudo, eles comem tudo” e não deixam nada nos bolsos do Estado, ou “eles poupam tudo, eles poupam tudo” e não deixam nada nos bolsos dos portugueses. A escolha só é consciente quando soubermos de qual dos lados gostaríamos de estar.


Autor: Paulo Fafe
DM

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8 abril 2019