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Afinal há ou não há dinheiro

Claro que há dinheiro e muito dinheiro, só que ou está bem aferrolhado e não se vê ou, então, usado é onde menos é preciso, como seja para salvar bancos falidos ou tapar buracos resultantes de ações ruinosas de gestão pública ou público-privada; e, efetivamente onde devia ser gasto e bem gasto, isto é na melhoria das condições de vida da maioria do povo, não passa pela cabeça do Governo. Todos sabemos que Mário Centeno, ministro das Finanças, quando lhe apontam as baterias da pedinchice, proclama, alto e bom som, que não há dinheiro; e, então, quando a réplica vem dos diferentes ministérios através da súplica do respetivo ministro, a receita é direta, simples e ditatorial: nem pensar em aumento das dotações orçamentais. Ora, este estado de coisas transporta-nos aos recuados tempos da ação governativa de António de Oliveira Salazar que, para livrar o país da bancarrota e sem troika, exigiu ao Presidente da República, Óscar Carmona, hegemonia financeira sobre todos os ministérios, controlando absolutamente as respetivas dotações e gastos; e, até se conta que, um dia, um determinado ministro, tentando habilidosamente um aumento de vencimento para os seus funcionários, usou da seguinte habilidade silogística: Senhor Presidente, os meus funcionários ganham tão pouco. Resposta pronta de Salazar: Também para o que trabalham, senhor ministro. Passados tempos, o ministro volta à carga, invertendo o argumento: Senhor Presidente, os meus funcionários trabalham tão pouco. De novo, resposta pronta de Salazar: – Também para o que ganham, senhor ministro. Bom, voltando à realidade atual que é a que nos interessa e não comparando o incomparável, cada ministro vive sob a ameaça, não da espada de Dâmocles, mas da de Centeno; e claramente exercendo sobre o povo a mesma austeridade do Governo de Passos Coelho, mesmo sem as exigências inexoráveis da troika. E a realidade é que, beneficiando da almofada que Vítor Gaspar, ministro das Finanças de Passos Coelho, e do aumento de impostos, a geringonça tem dinheiro e muito dinheiro, só que, como pau mandado da União Europeia, faz de todos nós um bando de anjinhos; e, sobretudo, um pelotão de esfomeados em busca de algumas migalhas que sobrem dos sucessivos Orçamentos de Estado. Pois é, mas Mário Centeno prefere que lhe chamem o Cristiano Ronaldo das Finanças e que louvem os últimos cinco anos da sua política orçamental, como fez o severo e sisudo ministro das Finanças alemão; e, até, quando Christine Lagarde, chefona do FMI, nos aponta como um exemplo mundial de política orçamental, Mário Centeno se enfuna como um pavão. Agora, olhando com bom senso e verdade para o que se passa no país real, desde 2011 os impostos diretos e indiretos, cobrados ao povo, renderam aos cofres do Estado mais de 41 mil milhões de euros e, nos três anos de geringonça, a cobrança dos mesmos impostos rendeu mais do que nos anteriores cinco anos; então, assim sendo, só se justifica tanta contestação social atual com greves constantes do funcionalismo público devido ao mau ou precário uso dos dinheiros públicos. Ademais, juntando a tamanho aumento de impostos os congelamentos de salários e carreiras da função pública, as constantes cativações e a redução drástica do investimento público, não dá para entender a governação da geringonça, apoiada numa austeridade encapotada, mas real; e, muito menos, para acreditar no que diz Mário Centeno, levando naturalmente a reboque o primeiro-ministro, de que não há dinheiro para o essencial e que é a melhoria das condições de vida do povo. Eu sei e todos sabemos que Mário Centeno vive obcecado pelo défice e quer ficar na história como o pai do défice mais baixo; e isso só se consegue com a exploração do povo através de sucessivos garrotes financeiros e apertos de cinto. Como diria o saudoso Fernando Pessa: – E esta, hem? Então, até de hoje a oito.
Autor: Dinis Salgado
DM

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13 março 2019